quinta-feira, 30 de abril de 2009

Os amores que nunca foram

Os grandes amores são aqueles que nunca foram . Não sei se criei essa frase ou se li em algum lugar, sinceramente não me lembro. Muito estudo, memória fraca. E se estou plagiando alguém me processem, por favor. Sei que isso ficou marcado nesses espaços sentimentais que a vida nos permiti preencher e nesses amores que a vida nos dá de presente e nos tira sem pedir permissão.


Quatro anos atrás, cinco horas da manhã. Eu já de pé, olheiras profundas, o café não tomado e o arrependimento de não ter comido nada,embora eu nunca tenha gostado de tomar café da manhã. Ninguém na rua, só a tristeza de ter que acordar cedo. Tanta vida do lado de fora das nossas obrigações. Vestido com o velho uniforme do colégio, sempre amassado, e carregando aquela velha ilusão adolescente que algo diferente vai acontecer. Nunca acontecia, ou quase nunca. Eu sempre saia bem cedo, dormia pouco e ás vezes deixava de tomar banho pra dormir mais cinco minutos. Cinco minutos que sempre viravam dez ou vinte. Era só mais um dia em que eu esperava o ônibus naquele velho ponto que nem lugar pra sentar tinha, “uma coluna de cimento com um toldo por cima”, como dizia um colega meu.


Como de costume, ás 5:20 eu estava lá pronto pra mais um ônibus, quando ela apareceu. Baixinha, meio fora de forma, um cabelo preto deslumbrante. Aquele ar de imperfeição e delicadeza que deixam as mulheres mais belas. Trocamos olhares. Aqueles olhos que jamais vi iguais, daqueles que entram em você e fazem a vida mais bela e quase ter um sentido. A vida é engraçada ás vezes e trágica quase sempre.
A partir daquele dia nos encontrávamos sempre debaixo da coluna de cimento com o toldo por cima. Eu a amava. Amor infantil ,sim, mas amor. Talvez, seja o amor que mais marcou a minha adolescência e que até hoje guardo grandes saudades. Os olhares que trocávamos eram sempre mágicos, os minutos que passávamos ali juntos esperando o ônibus eram pra mim o único prazer e a principal motivação da minha vida, uma vida que se dividia em estar com ela e esperar para estar com ela.


Nunca brigamos, nem tivemos problemas,aliás, nunca conversamos. Talvez esse tenha sido o grande mérito do nosso “relacionamento”, nunca nos conhecemos de fato. Ela era meu ideal, o mito do amor romântico, o conto de fadas, o lindo amor platônico. O amor real teria matado meus sentimentos sem piedade. A dureza , o amor capitalista e claustrofóbico não teria sido tão belo e não teria deixado pra mim uma das minhas saudades favoritas.
Terminei o colégio e nunca mais a vi. Depois de algumas eleições e aumentos de tarifa do ônibus, os pontos foram modernizados e o velho ponto caiu vítima do progresso. Hoje, quando passo naquela rua em que morava há alguns anos atrás e vejo o lugar onde ficava aquele velho ponto, só me resta o consolo de saber que foi um grande amor, e foi um grande amor por nunca ter sido.

Amo chocolate amargo

Mais um dia barato pra adicionar na conta, mas um dia que parece tão escuro como todos os outros. Como o chocolate amargo, o prazer da primeira mordida é sempre diminuído quando se sente o sabor com profundidade , quando se acha que a doçura vai se manter só resta o amargo.
Não que eu esteja brigado com a vida ou não a queira mais, mas ela que já não me quer. Festas, bebedeira, putaria. Tudo muito lindo, fútil e superficial. Essas coisa baratas já não me dão mais prazer.


Sentado no chão frio e solitário da faculdade, me vem a cabeça “Smells Like Teen Spirit” do Nirvana. Os gritos profundos do Kurt Cobain, a letra , a performance de quem sente a vida como uma punhalada. Uma punhalada, talvez essa seja a melhor definição do que sinto. Não fazem músicas como antigamente, nem dores existenciais. Hoje nos satisfazemos com Cláudia Leite e bobeiras do cotidiano.


Nesse mundo de amizades de conveniência , o desespero é uma vergonha, pensar é uma vergonha, ser algo é uma vergonha. Peço perdão pela vergonha que sou, mas peço perdão com profundo pesar , ao som de Cláudia Leite e com chocolate amargo. O que seria da vida sem chocolate amargo?